Eu já tive pressa; muita pressa.
Nesse alvitre, movido pelo desejo – irracional, às vezes – de fazer logo, de fazer hoje o que podia fazer amanhã, fui, muitas vezes, insensível, deixando, até, de manifestar os meus sentimentos mais nobres, contido e premido pelas circunstâncias da vida, como se não houvesse amanhã.
Hoje, passados os anos, já tendo vivido a dádiva da vida longa, me vejo perscrutando as razões de tanta impaciência, se havia mesmo motivos que me levassem a tanto açodamento.
Diante da constatação de que me impus uma urgência desnecessária, de que deixei a vida fluir sem dela usufruir como devia, digo pra mim mesmo, amadurecido e mais contido, repetindo uma passagem de uma bela canção popular (Tocando em frente, de Almir Sater), que, agora, sempre que possível, “ando devagar porque já tivesse pressa e levo um sorriso porque já chorei demais.”
A propósito da azáfama que nos move e que me levou a deixar de viver a vida como devia ter vivido, concluo, agora, quase a destempo, que eu devia, sim, ter compreendido a marcha da vida e simplesmente ter tocado em frente, buscando conhecer “as manhas e as manhãs, o sabor das massas e das maças”, como diz a bela canção popular antes mencionada.
Mas a verdade é que as pessoas têm pressa; todos têm pressa, porque, afinal, reconheçamos, a vida é um sopro, a nos impor a constatação de que tudo é pra ontem, impregnados que todos estamos de uma sensação inquietante de que, se não formos capazes de seguir a correnteza, se não entendermos o sentido da urgência, ficaremos pelo caminho.
Eu mesmo, em face do tempo, conquanto reconheça os equívocos de ter me apressado tanto, me pego pensando e concluindo que deixei de dar ao próximo o melhor de mim, o meu melhor sorriso, a parte doce da minha alma.
Correria maluca, desembestada, desenfreada, todos vivemos. Essa é a realidade da vida, mas injustificável, reconheço, porque, sei, ninguém pode domar o tempo, e ademais porque, afinal, há tempo de plantar e tempo de colher.
Diante de situações que tais, admito que, algumas vezes – ou não raro -, o óbvio precisa ser dito, daí a indagação que me inquieta e que me impulsiona a essas reflexões: para quê tanta pressa?
Não é incomum, diante da minha pressa – embora mais contido nos dias presentes -, as pessoas em meu entorno, simplesmente me advertirem, para me preservar, da desnecessidade da minha agonia.
Sou compelido a reconhecer que muita coisa podia ser diferente, sim, não fosse a minha pressa de fazer logo, de realizar logo; eu, seguramente, teria errado menos.
A propósito, trago a consideração, para ilustrar, uma passagem das reflexões de Amós Oz (Como curar um fanático. Israel e Palestina: Entre o Certo e o Certo, Companhia das Letras, p. 60), sobre a pressa que nos acomete a todos:
“[…] Há muitos anos, quando eu ainda era criança, minha sábia avó me explicou em palavras muito simples a diferença entre um judeu e um cristão – não entre um judeu e um muçulmano, mas entre um judeu e um cristão.
– Veja só, os cristãos acreditam que o Messias já esteve uma vez aqui e certamente voltará um dia.
Os judeus afirmam que o Messias ainda está por vir.
Por causa disso, houve tanta raiva, perseguição, derramamento de sangue, ódio…
Por quê?
Por que cada um não pode simplesmente esperar para ver?
Se o Messias chegar dizendo: Olá, é um prazer revê-los, os judeus vão ter de admitir e reconhecer o fato.
Se, por outro lado, o Messias chegar dizendo: Como vão, é um prazer conhecê-los, todo o mundo cristão terá de se desculpar com os judeus[…]”
Com as reflexões acima, resta indagar, mais uma vez: por que tanta pressa?
É isso.